domingo, 6 de novembro de 2011

Liberdade & Segurança

Em 1971 Stanley Kubrick lança Laranja Mecanica, filme adaptado da obra-prima de Anthony Burguess. O filme narra as atrocidades de Alex de Large e seus druguinhos numa Inglaterra futurista, em meio a estupros, velocidade alta e violência fisica contra mendigos, rivais e velhos. Após um acidente, que terminou na morte de uma idosa apaixonada por gatos e arte obscena, Alex é preso por homicídio e após dois anos é liberado para se submeter ao tratamento Ludovico.

E aqui chega ao ponto que queremos, o Tratamento Ludovico, que consiste em obrigar seus pacientes, sob efeitos de drogas, assistir a cenas fortes de violência, estupro e assassinato, com o objetivo de fazer a pessoa ter nojo, consequentemente, não realizar nenhum desses atos. Assim, Alex passa por todo esse processo, chegando no fim, apresentando-se a varias pessoas, como policiais, padres, governo e os médicos, realizando um pequeno teste para provar a eficaz do tratamento. Conclusão, Alex se torna um animal dócil, incapaz de machucar ninguém!

Viva! Tratamento maravilhoso esse. Com apenas 2 semanas (um pouco mais), e alguns videos violentos, você consegue tornar uma pessoa má caráter (determinada pela sociedade) em uma pessoa boa caráter (determinada pela sociedade). E promovendo essa mudança de caráter, torna a sociedade mais segura e livre! Esta é a solução para a segurança no mundo.

Otimo, agora vamos usar, mesmo que pequena, a nossa racionalidade! De fato, é a solução da segurança para o mundo? Onde entra o livre arbítrio? A liberdade de escolha? Até onde o tratamento sera utilizado em prol da sociedade, e nao contra ela? Então, você que ler esse texto, deve estar batendo no teclado e rindo, mas o Ludovico e ficcional, não existe! Será mesmo?

40 anos depois, no Brasil, o Ludovico pode ser considerado, além da sociedade, a nossa Policia Militar, que utilizando da violência e torturas, tenta erradicar a violência (violencia erradicando violencia? Essa é a logica) no país. E o mais temível, a utilização da PM contra a própria sociedade em favor do Estado (vulgo governo). Afinal, matar e violentar são atos que, por unanime, a sociedade desaprova, porém, atos como protestar, refletir e lutar pelos direitos, como são julgados? Bons atos, ou maus atos?

Pode parecer, visto rapidamente, que a Policia de fato é sinonimo de segurança, assim como o Ludovico, mas com atitudes vistas hoje, analisando profundamente os casos, a policia, como sistema de segurança, apresenta diversas falhas, que mais assustam, do que te deixam em seguro! Afinal, quem nunca teve medo de andar a noite pelo centro da sua cidade?

Para começar, violencia e tortura nao erradica violencia. Assim como no Ludovico, em que a tortura visual (assistir filmes com cenas explicitas de assassinato, estupro e violencia, ao meu ver é uma tortura visual) nao resolvia o problema de Alex, por simplesmente ele ainda ter um desejo de realizar seus atos, e realizara assim que possível, como visto no filme. Os atos da policia, muitas vezes, gera mais violencia. Matar e bater, causando um terror numa parcela da sociedade (pobres e negros, em sua maioria, vivendo nas favelas) não é solução, muito menos assegura a segurança, pois, como no caso famoso da Chacina da Candelária, que apenas gerou mais revolta no garoto Sandro, que tempos depois, protagonizou o Ônibus 174. 

E se você é um dos que concordam com os atos da policia (violentar e torturar, se possível, matar), e é apoiador da causa, bandido bom é bandido morto, volto novamente ao filme Laranja Mecânica, que retrata como a sociedade recebeu Alex, e pasmem (pra quem não viu o filme) ela utiliza dos meus atos do protagonista. Ou seja, olhe pro seu umbigo, talvez você seja tao bandido como aquele que a policia prende, a diferença é que você não é negro nem pobre (ok, eu sei que a policia não prende só negros e pobres, mas todos sabemos, ou devíamos saber, que é a maioria).

Ja nao vivemos na ditadura, propriamente dita, mas de vez ou outra, observamos atos da policia impedindo protestos (como em Teresina) e atos contra o governo, por simplesmente o Estado desaprová-los. Assim, o tratamento, ou, o sistema que serviria para proteção e segurança, é utilizado como ferramenta para impedir o livre arbítrio e a liberdade (não libertinagem, volta quando era criança que a professora perguntava a diferença entra as duas) de pessoas na sociedade.

Mas ai vem a dúvida cruel, infelizmente, nao respondida no filme. Como garantir a liberdade & segurança na nossa sociedade? Reestruturando nossa ferramenta de segurança, a policia seria um bom começo, afinal, os policiais estão sujeitos a morte diariamente, são ignorantes (no sentido de não possuírem as informações, que nós, estudantes, possuímos), salario ridículo (em SP com um pouco mais de 1400 reais), mal treinada e desqualificada. Alem disso, melhorias na estrutura educacional e estrutura urbana são fatores essenciais para toda sociedade.

O que acontece atualmente na USP é justamente isso. Ninguém ali é contra a segurança, mas todos temem a policia, não por deverem para a lei (como muitos ecoam atualmente a frase, quem não deve não teme), mas por perderem a liberdade de se expressar, protestar e realizar atos, por perderem a expressão do livre arbítrio  baseado em fatos do passado, em que a policia ja entrou (no ano de 2007 e 2009) para reprimir protestos e greves, direitos assegurados para o trabalhador. Medo maior de, quem sabe, terminar como um Alex, indefeso e vulnerável perante ao Estado.

Fazer parte da elite intelectual brasileira nao lhe torna inteligente se ainda opina utilizando do senso comum. Pense, reflita, seja racional! 


Um comentário:

  1. Isso aí, Filipe! Parabéns pelo texto. Conseguiste mostrar a opinião/o outro lado da moeda, do problema que estamos enfrentando atualmente na nossa universidade, de uma tal maneira que nos faz pensar em nossos sentimentos em relação a isso.
    São argumentos diretos e sucintos, e não as acusações e violência verbal que tanto venho vendo em grupos de discussão por aí.
    Parabéns, de novo (:

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