Em 1971 Stanley Kubrick lança Laranja Mecanica, filme adaptado da obra-prima de Anthony Burguess. O filme narra as atrocidades de Alex de Large e seus druguinhos numa Inglaterra futurista, em meio a estupros, velocidade alta e violência fisica contra mendigos, rivais e velhos. Após um acidente, que terminou na morte de uma idosa apaixonada por gatos e arte obscena, Alex é preso por homicídio e após dois anos é liberado para se submeter ao tratamento Ludovico.
E aqui chega ao ponto que queremos, o Tratamento Ludovico, que consiste em obrigar seus pacientes, sob efeitos de drogas, assistir a cenas fortes de violência, estupro e assassinato, com o objetivo de fazer a pessoa ter nojo, consequentemente, não realizar nenhum desses atos. Assim, Alex passa por todo esse processo, chegando no fim, apresentando-se a varias pessoas, como policiais, padres, governo e os médicos, realizando um pequeno teste para provar a eficaz do tratamento. Conclusão, Alex se torna um animal dócil, incapaz de machucar ninguém!
Viva! Tratamento maravilhoso esse. Com apenas 2 semanas (um pouco mais), e alguns videos violentos, você consegue tornar uma pessoa má caráter (determinada pela sociedade) em uma pessoa boa caráter (determinada pela sociedade). E promovendo essa mudança de caráter, torna a sociedade mais segura e livre! Esta é a solução para a segurança no mundo.
Otimo, agora vamos usar, mesmo que pequena, a nossa racionalidade! De fato, é a solução da segurança para o mundo? Onde entra o livre arbítrio? A liberdade de escolha? Até onde o tratamento sera utilizado em prol da sociedade, e nao contra ela? Então, você que ler esse texto, deve estar batendo no teclado e rindo, mas o Ludovico e ficcional, não existe! Será mesmo?
40 anos depois, no Brasil, o Ludovico pode ser considerado, além da sociedade, a nossa Policia Militar, que utilizando da violência e torturas, tenta erradicar a violência (violencia erradicando violencia? Essa é a logica) no país. E o mais temível, a utilização da PM contra a própria sociedade em favor do Estado (vulgo governo). Afinal, matar e violentar são atos que, por unanime, a sociedade desaprova, porém, atos como protestar, refletir e lutar pelos direitos, como são julgados? Bons atos, ou maus atos?
Pode parecer, visto rapidamente, que a Policia de fato é sinonimo de segurança, assim como o Ludovico, mas com atitudes vistas hoje, analisando profundamente os casos, a policia, como sistema de segurança, apresenta diversas falhas, que mais assustam, do que te deixam em seguro! Afinal, quem nunca teve medo de andar a noite pelo centro da sua cidade?
Para começar, violencia e tortura nao erradica violencia. Assim como no Ludovico, em que a tortura visual (assistir filmes com cenas explicitas de assassinato, estupro e violencia, ao meu ver é uma tortura visual) nao resolvia o problema de Alex, por simplesmente ele ainda ter um desejo de realizar seus atos, e realizara assim que possível, como visto no filme. Os atos da policia, muitas vezes, gera mais violencia. Matar e bater, causando um terror numa parcela da sociedade (pobres e negros, em sua maioria, vivendo nas favelas) não é solução, muito menos assegura a segurança, pois, como no caso famoso da Chacina da Candelária, que apenas gerou mais revolta no garoto Sandro, que tempos depois, protagonizou o Ônibus 174.
E se você é um dos que concordam com os atos da policia (violentar e torturar, se possível, matar), e é apoiador da causa, bandido bom é bandido morto, volto novamente ao filme Laranja Mecânica, que retrata como a sociedade recebeu Alex, e pasmem (pra quem não viu o filme) ela utiliza dos meus atos do protagonista. Ou seja, olhe pro seu umbigo, talvez você seja tao bandido como aquele que a policia prende, a diferença é que você não é negro nem pobre (ok, eu sei que a policia não prende só negros e pobres, mas todos sabemos, ou devíamos saber, que é a maioria).
Ja nao vivemos na ditadura, propriamente dita, mas de vez ou outra, observamos atos da policia impedindo protestos (como em Teresina) e atos contra o governo, por simplesmente o Estado desaprová-los. Assim, o tratamento, ou, o sistema que serviria para proteção e segurança, é utilizado como ferramenta para impedir o livre arbítrio e a liberdade (não libertinagem, volta quando era criança que a professora perguntava a diferença entra as duas) de pessoas na sociedade.
Mas ai vem a dúvida cruel, infelizmente, nao respondida no filme. Como garantir a liberdade & segurança na nossa sociedade? Reestruturando nossa ferramenta de segurança, a policia seria um bom começo, afinal, os policiais estão sujeitos a morte diariamente, são ignorantes (no sentido de não possuírem as informações, que nós, estudantes, possuímos), salario ridículo (em SP com um pouco mais de 1400 reais), mal treinada e desqualificada. Alem disso, melhorias na estrutura educacional e estrutura urbana são fatores essenciais para toda sociedade.
O que acontece atualmente na USP é justamente isso. Ninguém ali é contra a segurança, mas todos temem a policia, não por deverem para a lei (como muitos ecoam atualmente a frase, quem não deve não teme), mas por perderem a liberdade de se expressar, protestar e realizar atos, por perderem a expressão do livre arbítrio baseado em fatos do passado, em que a policia ja entrou (no ano de 2007 e 2009) para reprimir protestos e greves, direitos assegurados para o trabalhador. Medo maior de, quem sabe, terminar como um Alex, indefeso e vulnerável perante ao Estado.
Fazer parte da elite intelectual brasileira nao lhe torna inteligente se ainda opina utilizando do senso comum. Pense, reflita, seja racional!
Isso aí, Filipe! Parabéns pelo texto. Conseguiste mostrar a opinião/o outro lado da moeda, do problema que estamos enfrentando atualmente na nossa universidade, de uma tal maneira que nos faz pensar em nossos sentimentos em relação a isso.
ResponderExcluirSão argumentos diretos e sucintos, e não as acusações e violência verbal que tanto venho vendo em grupos de discussão por aí.
Parabéns, de novo (: